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Se recuássemos uma década, o conceito de food styling era praticamente desconhecido em Portugal. Bárbara Tomaz admite que não cresceu a querer ser food stylist e nunca pensou entrar e vingar neste mundo, mas a empreendedora, que já exerceu profissões como terapeuta da fala, delegada de informação médica e artesã de bijuteria, descobriu à volta da mesa uma paixão que combina encontrar harmonia no prato com a melhor forma de a captar em imagem. Diz que tem muita sorte por poder trabalhar com um “ninho de talento” que constitui a equipa que a rodeia e decidiu escrever um livro sobre a temática do food styling quando se deparou com a enorme falta de informação, especialmente em língua portuguesa, para quem queria começar a trabalhar nesta área.

“Quando somos pequenos temos uma aspiração a ser algo e eu nunca aspirei a ser nada do que sou hoje em dia”, começa a contar Bárbara Tomaz. A base era a terapia da fala, mas o seu percurso profissional revela um currículo vasto e recheado. Durante seis anos, foi delegada de informação médica, até a filha adoecer e ter de se despedir para se dedicar a ela. “Não querendo ficar quieta”, lançou uma linha de acessórios que chegou às mãos e aos rostos de algumas das mais proeminentes figuras públicas portuguesas. “Tenho em mim um lado muito criativo que não tinha descoberto até então”, afirma. Continuou com trabalhos pontuais para “estar ocupada” até que foi desafiada pela mãe de uma colega da filha para entrar no mundo Bimby. “Ela incentivou-me ‘Bárbara, venha a uma reunião, você já tem experiência a vender medicamentos’, mas preocupava-me que eu estava habituada a uma venda muito assertiva e agressiva. Ela convenceu-me, fui a uma reunião e apaixonei-me pelo conceito da empresa”, revela. Na parte comercial, porém, as coisas não resultaram. “Era péssima vendedora. Como vinha da especialidade de farmácia hospitalar, uma venda agressiva, de posicionamento de produto, em que lidamos com o bem-estar e com a morte, para mim entrar em casa das pessoas, oferecer-lhes uma refeição, dar-lhes todos os benefícios da máquina, e no fim dizerem que não querem comprar, não fazia sentido, eu não percebia”, comenta.

Nove meses depois, quis deixar a atividade, mas a pessoa que geria a equipa ficou impressionada com a criatividade demonstrada por ela. “A pessoa que me geria dizia-me ‘Bárbara, é tão construtiva, tão criativa, adoro as suas ideias nas reuniões’, mas eu era péssima para as vendas e estava a baixar o ritmo e o rácio da equipa. Pedi, no entanto, se podia continuar a ir semanalmente às reuniões ouvir a criatividade das pessoas porque adorava aquilo. Saí e duas semanas depois ligaram-me a pedir o meu currículo e a informar-me que havia uma vaga para testers de receitas. ‘Tens tanto jeito para alteração de receitas’, diziam-me, e eu achei que sim, que era algo que podia fazer, adoro cozinhar, estava em casa e assim começou”, conta. O caminho foi fluindo até que surgiu um convite inesperado: assistir a uma sessão fotográfica da revista. “O meu primeiro contacto com o food styling. Convidaram-me para ajudar a senior recipe developer nessa sessão, mas frisando que não havia qualquer hipótese de entrada naquela equipa, era apenas uma oportunidade para observar e perceber como funciona a dinâmica da construção de uma revista de comida. Fiquei em êxtase, só conhecia o lado da preparação da comida, tinha sempre algum cuidado na finalização das receitas, algo inconsciente que não estava associado ao food styling nem ao empratamento, e adorei a experiência”, recorda.

O bolo de manga que demorou três tentativas até desenformar

Assim se abriu uma porta que até hoje nunca mais se fechou. “Lembro-me que naquela sessão até tivemos um contratempo, a prop stylist apresentou-nos uma forma muito pequena para um bolo de manga e eu tive de fazer três vezes porque não desenformava. Fiquei tristíssima. No meio de 12 receitas, aquela tinha corrido mal logo durante uma oportunidade que me deram. Mesmo sabendo que não ia ficar, queremos sempre dar tudo”, salienta. A verdade é que a direcção já estava de olho nela e mal acabou a sessão, chamaram-na ao gabinete. “à minha frente, duas pessoas à mesa com um grande envelope. Perguntaram-me se tinha gostado da experiência, que estavam satisfeitas com o meu trabalho e qual a melhor coisa que poderiam fazer por mim naquele momento. Respondi que precisava de um emprego que não envolvesse ser agente porque não tinha resultado, precisava de rotinas e orientação. Aproximaram o envelope e disseram ‘é isso que temos para si’. Foi um momento extremamente emocional, eu estava fora do mercado de trabalho há um ano, tinha sido um período difícil em termos familiares, e aquela foi uma grande oportunidade”, afirma. A partir daí, pôde dedicar-se a um gosto que, pensando bem, tinha raízes escondidas. “Sempre gostei de revistas de comida, principalmente as internacionais, levava ralhetes por folhear as revistas, mas não sabia nada do mundo da fotografia de comida, não sabia que existia um food stylist. Quem trabalha comigo diz que eu tinha em mim isto do food styling e eu não sabia, esta necessidade de harmonia dentro do prato”, revela.

Entrar neste mundo foi uma descoberta. “O food styling é um cuidado extremo com a harmonização do conteúdo que se coloca num prato. Em Portugal, não é comum existirem equipas multidisciplinares. Felizmente, na revista onde trabalhei, havia essa possibilidade, tinha fotógrafo, food stylist, prop stylist, coordenadora de fotografia, e pessoas para desenvolver as receitas, ir às compras, arrumar a cozinha. O que acontece, especialmente em equipas pequenas, é a fusão entre food stylist e prop stylist, muitas vezes devido à falta de orçamento. Mas o food stylist puro tem apenas o cuidado e responsabilidade da finalização da comida e do empratamento. Em termos editoriais, o objetivo é que as pessoas que vão ver aquela fotografia a queiram repetir em casa, comer o prato, dar-lhe uma nuance diferente. Já o prop stylist é a pessoa que leva a toalha maravilhosa de linho onde o food stylist vai colocar o prato que empratou. É uma dinâmica de equipa em que todos podem fazer aquilo que gostam e dão o seu melhor”, declara.

Um nicho que começa a ganhar dimensão

Todos estes conceitos são relativamente recentes, mas é um nicho, diz Bárbara Tomaz, que “começa a ganhar dimensão. Não deixa de ser um nicho comparado com outras áreas, mas há uma evolução ao nível do cuidado da imagem da comida. Se formos ver as Teleculinárias dos anos 80, eram fotografias amareladas, copos muito grandes, quase estávamos dentro de um borrego. Essa tendência foi deixada de lado, passamos para algo mais inspiracional, ao lado do bolo colocamos o rolo da massa, um bocadinho da farinha, há todo um storytelling. Agora, voltámos aos grandes crops, mas com outro nível de cuidado na apresentação final, o destaque é a comida e não os utensílios. O food styling é como a moda neste aspecto, vai seguindo tendências”, explica. Para Bárbara Tomaz, “não há certo ou errado”, e por isso pessoas com trabalhos relacionados com a área, como os foodies e os influencers de comida, devem seguir o que “faz sentido para eles” para “encontrarem a sua identidade”. “Às vezes, tenho pena porque vejo pessoas com trabalhos espectaculares ao nível do storytelling, mas que precisavam de investir na qualidade da fotografia para dar aquele salto. Claro que falo com as costas quentes porque trabalho com um fotógrafo incrível que é o meu mentor desde 2013 e me deu oportunidade de evoluir no food styling e ganhar algumas competências na fotografia. Temos de agarrar as pessoas que nos ajudam. Há espaço para todos. Por mais que digam que os mercados estão saturados, há espaço para nos ajudarmos uns aos outros e partilharmos o nosso conhecimento. Há sempre quem saiba mais do que nós, mas também há quem não saiba tanto quanto nós e esse conhecimento ajuda essas pessoas. O egoísmo que há nestes nichos leva apenas a perda de tempo”, frisa.

A base do conceito de food styling está bem presente ao longo dos séculos através da preocupação pela disposição da comida. “Tenho um livro – Os Jantares de Gala, de Salvador Dalí – que para quem gosta desta área é muito interessante. Vemos a forma diferente e extravagante que ele tinha de expor as suas ideias e a sua arte aplicada ao nível da mesa. Mostra que o cuidado com a imagem da comida já existia, o facto da pintura de uma natureza-morta, de uma caçada, de um banquete de Outono, tocar o inconsciente da harmonia ao nível da mesa”, aponta, sublinhando como é interessante recuar às origens para perceber a evolução. “Encontrei também um artigo que deve ter sido publicado entre a 1.ª e 2.ª Guerras Mundiais sobre a comercialização de enlatados através de almanaques e revistas, fazendo gravuras das latas de tomate em t-shirts. Queríamos que as pessoas comprassem um produto usando a imagem real do mesmo. Depois, os programas de televisão de culinária que tinham apenas uma oportunidade, one shot, ou ficava bem ou não havia retoque em Photoshop. Só comecei a ouvir falar de food styling em 2013, mas a base deste conceito tem uma história de centenas de anos ligada à história da arte. O termo food styling, que não tem tradução nos mercados português, alemão e espanhol, é recente nas nossas cabeças, mas é um conceito que efectivamente existe há algum tempo”, elucida.

Empratamento de 40 a 60 receitas mensalmente

Evolução é a palavra-chave, tanto para o conceito, como para a própria Bárbara Tomaz, que arrecadou ao longo dos anos uma experiência invejável neste meio. “Trabalho há sete anos na edição mensal de uma revista, pelas minhas mãos empratadas mensalmente entre 40 a 60 receitas, a diversidade de comida que eu tive oportunidade de empratar é imensa e impor desafios a mim mesma para ter um bom resultado final é incrível. Enquanto um foodie tem tempo para partilhar as suas receitas, eu tenho de ter um nível de desenvolvimento de receita e capacidade cerebral e elasticidade de empratamento completamente diferentes para trabalhar em revistas e livros, porque também publicámos 30 livros nos últimos 10 anos”, conta. Tantas receitas, além de imagens apetitosas, envolveram também peripécias inesquecíveis. “Trouxe-me muitos desafios. Outros têm a opção de usar produtos não comestíveis, mas eu trabalho numa empresa de robôs de cozinha e o prato final tem de ser possível replicar em casa do cliente. Então, temos de fazer o melhor com o que temos e isso deu-me algum traquejo. Posso falar de cheesecakes que não solidificam no tempo que queremos, cortamos e desabam; bolos que achamos que estão cozidos e, quando cortamos, estão crus no centro; pedaços de carne que antes de cozinhar já eram pequenos e depois de cozinhar ficam minúsculos. Há uma data de situações que acontecem e que nos vemos obrigados a contornar”, afirma.

Noutros trabalhos, porém, Bárbara Tomaz admite já ter trabalhado com soluções quimicamente produzidas. “Quando trabalhei com uma empresa de cervejas, tínhamos um copo de reserva preparado quimicamente com uma espuma que não é orgânica para o caso de a espuma verdadeira não reagir da forma que queremos e o fotógrafo não a conseguir captar. O foco é a aparência final do produto. A cerveja até pode ser muito boa e fazer muita espuma, mas se ela não aguenta parada para o fotógrafo fotografar… Não é uma questão de qualidade, é uma questão da fotografia, que leva tempo”, frisa, revelando que os “copos para fotografar bebidas podem ser preparados com dois dias de antecedência. Pomos um produto antiderrapante e outro que faz gotas e as gotas ficam imaculadas e dá a sensação de frescura e depois é só pôr a bebida lá dentro. Há fotografias que as pessoas acham incríveis de bolos com chantilly e 60% são espuma de barbear. Já fiz trabalhos desses noutros sítio em que o cliente queria aquele resultado final, mas da minha experiência é muito mais desafiante e gratificante dar a volta e podermos comer tudo aquilo no fim”, afirma, entre risos.

Baked Alaska, o bolo que não se esquece

Se lhe pedirem para empratar um risotto ou um esparguete, Bárbara Tomaz revira os olhos de tantos que já empratou, fá-lo de forma quase automática. Talvez por isso, e pela sua própria natureza, prefira os desafios. “Fotografar um gelado é a maior dor de cabeça de um food stylist”, revela. E sobre isto enumera alguns dos momentos mais complicados em estúdio. “Uma das capas foi um Baked Alaska, um bolo que tem massa, globo de gelado, é coberto por merengue italiano, queimado, e tem de ser cortado para fotografar. E nada daquilo pode murchar. Posso dizer que foi dos momentos mais desafiantes por causa do timing e porque, ao contrário dos grandes estúdios que têm túnel de frio onde estas produções acontecem, ali estávamos a trabalhar sete em pleno Verão todas a respirar no mesmo espaço, enfim, não há ar condicionado que refrigere… mas conseguimos fazer. É um desafio altamente estimulante”, salienta, não deixando de elogiar o trabalho de pós-produção que ajuda a obter o resultado final perfeito. “Hoje em dia temos pós-produtores incríveis que conseguem fazer coisas maravilhosas e fazem-nos acreditar que era assim que estava quando fotografámos”, declara. Quem fala num Baked Alaska, fala também em sobremesas como gelado frito, sendo que o denominador comum está sempre lá. “No próximo livro, vou pôr dica de gelados, que é algo que me perguntam muito”, comenta.

Autora do livro ‘Food Styling de Bárbara Tomaz’, empenhou-se neste projeto devido à grande necessidade que sentiu quando começou a trabalhar no meio. “Procurei durante muitos anos informação sobre isto e deixou-me altamente frustrada a pouca informação que existia em português. Foi isso que me levou a escrever o meu livro”, conta. A lacuna no mercado e o incentivo das amigas. “Diziam-me ‘devias partilhas as coisas que inventas’. E então juntei o útil ao agradável porque de facto o que havia era uma dica aqui, outra ali, mas a maioria em inglês ou francês. Eu tenho algum domínio destas línguas, mas quem não tem é muito mais difícil encontrar informação. Achei que seria útil e como na pandemia estávamos todos em casa, trabalhei nisso e apresentei o projecto à editora”, recorda. A proposta já tinha definido todas as características – tipo de letra, papel, capa – porque além de um objecto com utilidade, Bárbara Tomaz queria que fosse um elemento decorativo. “Não queria um livro que fosse para ter na cozinha, queria um livro de sala. A maior parte das minhas amigas que não percebe patavina de food styling é onde guarda o livro porque gostam de livros bonitos”, acrescenta.

O caminho fez-se caminhando e tem corrido tão bem que agora as solicitações são em maior número do que o tempo disponível para as aceitar. “Fui evoluindo, criando o gosto, ao longo do tempo percebi as áreas que gostava mais, que são empratar e fotografar, e agora sei posicionar-me. Não digo ‘eu faço tudo’, prefiro dizer ‘faço isto, se puderem chamar esta colega para trabalhar comigo nesta área, como no prop styling, ela é melhor do que eu e vão ficar com um projecto mais equilibrado’. Temos de saber o nosso lugar. Encaminho imensos trabalhos para colegas porque há coisas que não faço e há pessoas que o fazem tão bem no mercado”, salienta. Acredita que hoje é uma melhor profissional graças ao “ninho de talento” com quem tem o privilégio de trabalhar e que a ajuda muito – Ana Trancoso, António Nascimento, Joana Alvim – e continua apaixonada pela área que a acolheu. “Absorvi o conhecimento de todas estas pessoas e apaixono-me mais a cada dia. A pessoa que vai às compras escolhe os ingredientes e faz-me apaixonar mais porque me trouxe as maçãs mais encarnadas ou as cebolas mais pequenas. Sinto uma evolução e gosto muito do trabalho que faço, embora ainda tenha muito para aprender e crescer”, afirma. Para quem quer começar no food styling, Bárbara Tomaz deixa apenas dois conselhos: aprendam com quem o faz bem, a ver essas pessoas a trabalharem porque “a aprendizagem dá-se quando as coisas estão a acontecer”, e pesquisem muito, “hoje há muita informação na Internet, muitos tutoriais, workshops”. E, claro, se tiverem oportunidade, “invistam numa boa máquina, que permite evoluir”.

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