Não gosta de surpresas, de sushi, de limar as unhas e de tantas outras coisas numa lista que só a blogger Maria das Palavras poderia fazer. Apaixonada por livros, é conhecida pelas suas dicas de leitura e viagens de costas voltadas para os seguidores, literalmente e não metaforicamente, mantendo-os informados e divertidos com todas as peripécias que ela e o Moço experienciam. Renovou o guarda-roupa graças à descoberta da sua paleta de cores, acredita que viver a vida com tranquilidade e sem dar grande importância aos contratempos é viver em pleno e nesta edição aceitou responder às nossas 10 Perguntas improváveis.
- O que é viver em pleno?
Começo a achar que viver em pleno é viver sabendo que nada importa assim tanto. Perceber que somos ínfimos e finitos e, portanto, nada – incluindo as coisas que o são – é assim tão grave que nos deva fazer deixar de apreciar o que podemos, enquanto podemos, ou seguir os nossos sonhos. Entendo que parece um pensamento negativo, mas na verdade tem uma intenção muito positiva. Nunca fui uma ‘carpe diem kind of person’, nem passarei a ser. Mas quanto mais percebo que não posso controlar tudo o que me acontece, mas posso controlar como reajo, ou que o medo de seguir sonhos às vezes parte do conforto que temos, mais caminho para algo que se pareça com uma vida plena. Vou dar um exemplo: não fiz determinada viagem em Fevereiro de 2020 porque me parecia importantíssimo estar presente no meu trabalho nessa altura. Se tivesse ido, neste momento o ponto de situação no trabalho estaria exactamente no mesmo sítio, mas eu teria tido mais uma experiência fantástica na colecção, antes de meses de isolamento. Tive medo. E não importava assim tanto.
- Que dom trazes contigo?
Saber ler as situações e as pessoas. Acho que é aquilo a que se chama inteligência emocional. Por exemplo, em determinada conversa que está a dar para o torto num grupo, sei o que posso dizer para virar a conversa e os limites em que não posso tocar com determinada pessoa que já esteja sensível. O que não quer dizer que tenha sempre a frieza para agir no melhor sentido. Calha que saber o que dizer ou fazer, ou querer efectivamente fazê-lo, são coisas diferentes. O que sei é ler o público e manobrar o discurso – ou seja, estou a um milímetro da desonestidade de acabar na política. Aqui devia ter dito que o meu dom é escrever, mas falho muito nas vírgulas e não tenho disciplina para fazer algo que se leve a sério, portanto vou bloquear a resposta acima. - Quando foi a última vez que fizeste algo pela primeira vez?
Bom, a última coisa mesmo foi estar dentro de um carro a ser rebocada por um jipe, depois de termos ficado atolados na lama, mas essa não foi uma estreia intencional. Penso que a última coisa nova e diferenciadora que me propus a fazer – e fiz mesmo – foi uma análise pessoal de cor. Ou melhor, alguém a fez para mim, mas fui eu que pedi e paguei. Trata-se de uma sessão em que descobrimos efectivamente quais as cores que harmonizam melhor connosco e nos favorecem (para roupa, cabelo, acessórios). Parece profundamente fútil, mas para mim fez parte de um processo de autoconhecimento e ajudou-me a valorizar-me um pouco numa altura em que estava a precisar disso. Até porque depois de mais de um ano em teletrabalho, já não me reconhecia dentro do meu armário. Os saltos altos, vestidos justos, blazers elegantes, pareciam pertencer a uma Maria do passado. Acho que muitos de nós terão passado por isto recentemente e essa sessão foi uma forma de começar a desbloquear esse sentimento. - O que te ampara nos dias difíceis?
Ler e escrever. Psicólogos em todo o mundo diriam que é a forma errada de lidar com dificuldades, mas o meu método é o evitamento. Se já não há nada a fazer, pelo menos naquele momento quero abstrair-me. Escrever é a minha forma de desabafar, a minha terapia, e noto que escrevo muito mais em fases em que me sinto menos enérgica e animada. Ler é a minha forma de fugir. Claro que também leio e escrevo quando estou em dias fáceis, afinal continuam a ser os meus hobbies favoritos. - Que objectos salvavas num incêndio?
A resposta que me ocorre é: nenhum. Tenho demasiados livros para poder carregá-los e, no geral, não sou apegada a objectos emocionais – pelo menos não ao ponto de me lembrar de algo em caso de aflição e urgência. Sou muito prática, por isso mais facilmente pegaria em roupa quente, telemóvel e computador para poder resolver a minha vida depois do incêndio do que quereria salvar algo pelo seu simbolismo. Pronto, vou dizer o Kobo, porque tem dentro muitos livros e poderia entreter-me. Aliás, visto que depois passaria dias difíceis e ler é o meu método de lidar com eles, provar-se-ia precioso. - O que as pessoas mais te dizem?
“Uau, que beleza e inteligência magnificentes!”. Mentira, ninguém me diz isso. Talvez o mais frequente seja dizerem que sou engraçada ou que tenho sempre a resposta na ponta da língua. Acho que é verdade. A primeira de forma comedida e muito baseada em provocação e sarcasmo. A segunda está quase sempre no tom da primeira. - Quando te surpreendes a ti própria?
Odeio surpresas, por isso jamais me faria isso. Odeio sentir que sou a última a saber de algo, sinto-me uma tolinha. Daí não gostar nem das mais bem-intencionadas surpresas, sobretudo se envolverem meter-me em situações sociais para as quais não estava devidamente preparada – como aquela vez em que eu achava que ia ao cinema com um casal de amigos e eles tinham tudo combinado para um jantar de despedida de Lisboa cheio de gente. Gente que eu adoro? Sim, mas é irrelevante. Senti-me uma idiota. - O que não suportas nem toleras?
Surpresas (já disse). Mon Chéri. Sequer a ideia de limar unhas (já estou arrepiada). Tempestades em copos de água. Cócegas nos pés. Sushi. Pessoas que dizem que não gostam de ler com base nos traumas do secundário, sem terem experimentado ler outra coisa por vontade própria. Bebedeiras que necessitem da minha assistência. Discussões profundas com pessoas cuja opinião não me interessa minimamente. Quem acha que eu tenho sorte porque o moço faz tarefas domésticas, como se isso não fosse requisito mínimo para seres humanos com quem partilhamos a casa. Ervilhas a estragarem um prato de boa comida com o seu travo doce. Podia ficar aqui o dia todo e ainda só estou no campo pessoal. - Que pessoa, viva ou morta, convidarias para jantar se o sim fosse assegurado?
Não tenho propriamente ídolos, não sou pessoa de pedir autógrafos e cada vez mais tenho preguiça de socializar, pelo que vou considerar esta a pergunta mais difícil de todas. Mas vou dizer o mestre Stephen King, pois adoraria que me contasse em primeira mão sobre a sua vida e métodos de trabalho. Sei que ele tem um livro chamado ‘Escrever’ que fala um pouco sobre isso e tenciono lê-lo, mas já que me apresentam assim a oportunidade, atalhava a leitura e ia logo à fonte. Já agora, vou aproveitar para recomendar um livro dele, que é dos meus favoritos da vida: Misery. Sei que ele é o mestre do terror, mas prometo que este não mete fantasmas. Não prometo que não seja violento. Ou louco. - O que gostavas que te perguntassem?
“Queres que te pague uma pequena fortuna para dares a volta ao mundo, a escrever enquanto viajas?”. Até estou a exagerar, nem precisava de ser fortuna de tamanho nenhum, desde que me sustentasse – incluindo boas estadias (oh! nada de campismos e couch surfing) e comida local da boa em sítios relativamente instagramáveis. E nem precisava de ser a volta ao mundo, podia ser só Europa. Península Ibérica. Portugal?