Ela tinha 10 anos. Saiu da primária rumo à escola nova cheia de esperança em encontrar novos amigos e criar memórias felizes. O que encontrou foi a maldade em forma de crianças de famílias abastadas que a escolheram como alvo das suas “brincadeiras”. Todos riam mas ela não conseguia perceber onde estava a piada. Criticavam as suas roupas, o seu cabelo, as suas pernas, até os sinais da sua pele. Ela não percebia, sobretudo, porque a escolheram a ela, que só queria estudar, que ficava no seu canto, que não se metia com ninguém.
As gargalhadas eram insuportáveis, mesmo tapando os ouvidos, continuava a ouvir bem dentro da sua cabeça. Os olhares de nojo, os dedos apontados, os exércitos de rapazes desgovernados que vinham na sua direcção a toda a hora oferecendo chapadas psicológicas que doíam muito mais do que qualquer acção física que pudessem realizar. Embora também essas não faltaram, apalpões, encostares à parede, rasteiras, tirar objectos pessoais. Quanto mais ela se chateava, quanto mais ela pedia para pararem, quanto mais ela chorava, maior era o sorriso deles. Ela não sabia, mas isto era o bullying.
Cinco anos de tortura até que a tempestade deu lugar à bonança. Os amigos vieram, as boas notas persistiram, ela conseguiu desabrochar apesar da auto-estima tão devastada. E, no entanto, as cicatrizes ficaram. Cruas, dolorosas, feias. Ela não queria sequer olhar para elas. Rasgaram a confiança nos outros, transformaram a impulsividade da juventude nas acções mil vezes calculadas de um adulto cheio de experiência, afastaram-na de potenciais amores que ela não soube reconhecer. Hoje ela tem 30 anos e, às vezes, regressa àquela menina assustada que não sabia quem era e tudo o que queria era ser amada. Ela resistiu, e resiste, mas tantos outros não conseguiram. Tantos outros futuros génios, heróis, mentes brilhantes, 30 under 30, CEO de sucesso, ou apenas grandes pessoas com corações que abarcavam o mundo, ficaram pelo caminho. O caminho que o bullying lhes tirou.
Daniela Castro Soares
Directora Editorial Magafone