Dois apaixonados por viagens à boleia de uma Pingu, agora com um bebé “sociável e simpático” de apenas sete meses que já dorme melhor na carrinha do que em casa. Carolina Vieira e Pedro Cerqueira falam do início desta viagem em conjunto, do amor pelas autocaravanas e das experiências que querem transmitir ao pequeno Lourenço.
Conheceram-se na escola em Vila do Conde e consolidaram a amizade numa visita de estudo de 10.º ano. Namoraram e terminaram a relação uma série de vezes, “coisas de adolescentes”, até que finalmente Carolina Vieira e Pedro Cerqueira decidiram juntar os trapinhos. O amor um pelo outro foi crescendo e aliou-se a outro amor que sempre esteve lá. “A nossa vontade sempre foi de viajar, não de uma forma específica, mas viajar. As autocaravanas surgiram mais tarde, por causa do estilo de viagem, mais minimalista, mais fácil, com mais liberdade”, diz Pedro Cerqueira, garantindo que “depois de experimentarem a primeira vez, já não quiseram voltar a viajar de outra forma. Viajamos quase sempre de autocaravana agora”, diz.
Pedro Cerqueira já tinha a prática de “comprar autocaravanas e experimentá-las enquanto não as vendesse. Ia em viagens e, entretanto, juntei-me com a Carolina e começamos a fazer essas viagens juntos. Viajámos por Portugal e percebemos que era um estilo de viagem que gostávamos e que queríamos fazer mais vezes”, conta. Aproveitavam todos os fins-de-semana para “dar umas voltas pela região” até fazerem a primeira grande viagem, 10 dias, à Costa Vicentina. “Conhecemos alguns pontos, como o Portinho da Arrábida, Sesimbra, uma zona encantadora, e a viagem de autocaravana foi um sonho, adorámos. Isso contribuiu para que hoje não gostemos tanto de viajar de outra forma”, revela.
Pingu comprada em San Sebastián
Comprar a própria autocaravana tornou-se inevitável. “A Pingu surge em 2017. Casámos em Setembro e queríamos dar uma prenda a nós mesmos e então em Dezembro comprámos a Pingu. Fomos buscá-la no dia 27 a San Sebastián, em Espanha, na fronteira com a França, e o regresso foi viagem incrível, demorámos 2/3 dias a chegar porque queríamos parar em todos os sítios”, recorda. A ideia inicial era “comprar uma carrinha para reconverter”, iludidos com “o processo, a mística, a ideia de criarem o próprio espaço”, mas começaram a ver os preços das carrinhas e desistiram. “Por pouca diferença conseguia-se comprar uma já convertida de origem. Encontrámos a Pingu, convertida de origem, quase toda original, pagámos um pouco mais do que aquilo que estávamos a contar, mas não pensámos duas vezes e estamos muito contentes”, confessa Pedro Cerqueira.
Mas afinal quais são as vantagens de viajar de autocaravana? “A liberdade. Acontece muitas vezes planearmos ir para um sítio e depois quando chegamos está mau tempo ou está muita gente. Com a autocaravana, metemos a chave na ignição, arrancamos e vamos para outro sítio, vamos atrás do sol e descobrimos destinos incríveis, que não estavam nos planos, acontecem boas surpresas”, garante. Em termos de preço, “acaba por ficar mais barato viajar desta forma. Viajamos ao nosso ritmo, gastamos aquilo que queremos, gastamos de uma forma mais consciente, e as refeições podem ser feitas na autocaravana, embora não costumamos fazer, porque gostamos de conhecer a gastronomia local”, diz. Ainda, “conhecem-se pessoas com o mesmo espírito. Quando vais de mochila às costas ou de avião, nem sempre encontras pessoas com a mesma filosofia porque podem estar a viajar por diferentes razões; pelo contrário, é muito fácil travar amizade com quem viaja de autocaravana, porque pensamos de forma similar, gostamos de conhecer as carrinhas uns dos outros, partilhamos coisas típicas do nosso país com estrangeiros, como uma cerveja que eles nunca beberam… É mais fácil conhecer pessoas com que nos identificamos”, explica.
E experiências negativas? Pedro Cerqueira tem de pensar bastante. “Felizmente, nunca tivemos grandes experiências negativas, tirando uma ou outra situação mecânica que facilmente se resolve, coisas pontuais, e até isso acaba por ser engraçado porque crescemos e aprendemos”, afirma, vendo sempre o lado positivo. Não se lembra de grandes contratempos como também já não se lembra de quantos sítios estão na bagagem da Pingu. “Já temos muitas histórias na Pingu, ela já conheceu muitos sítios connosco, corremos Portugal inteiro, fomos a Espanha… Em 2019, fizemos uma viagem de seis meses por toda a Europa, era a grande viagem que queríamos fazer. Saímos em Abril e fomos à descoberta do Norte da Europa e depois viemos para o Mediterrâneo curtir as praias”, lembra.
“Conhecemos pessoas incríveis ao longo das nossas aventuras”
Pessoas marcantes ao longo do trajecto
Mais do que os momentos, “ficaram as pessoas. Conhecemos pessoas incríveis ao longo das nossas aventuras”, salienta. Dos sítios por que passaram, destaca a Escócia, a Bósnia, a Eslovénia mas exalta sobretudo a Grécia. “Tínhamos planeado ficar duas semanas na Grécia e acabámos por ficar cinco. Condicionou o resto da viagem mas não conseguíamos sair de lá, era incrível. Na Grécia, há uma facilidade em viajar de autocaravana, podemos estacionar em qualquer lado e sentimo-nos bem-vindos”, sublinha, acrescentando que as pessoas incentivam a estacionarem nos seus terrenos, nas praias, e os restaurantes deixam usar os sanitários sem consumir. “Claro que depois de oferecerem, não conseguimos ir embora sem consumir, comemos sempre o pequeno-almoço ou o almoço. Acabamos por dar receita aos restaurantes e torna-se benéfico para ambos”, explica.
Ao contrário do que acontece em Portugal. “Em Portugal, ganhava-se mais se fosse assim. Faz sentido controlar os abusos, e obviamente que os há, há demasiadas autocaravanas em algumas zonas do país, e essas zonas têm de ser controladas, mas há zonas que precisam deste turismo e essas estão a ser privadas deste tipo de consumo”, diz Pedro Cerqueira, apontando: “Ao contrário do que se pensa, os autocaravanistas não são autossuficientes, todos consomem, fazem compras, vão aos restaurantes. Temos de lutar para mudar mentalidades e fazer as pessoas perceberem que não é por causa dos autocaravanistas que há mais lixo. Pelo contrário, os autocaravanistas prezam por manter os sítios limpos e bonitos porque passam lá muito tempo. Ninguém faz lixo no sítio onde dorme ou estende uma toalha”.
Mochileiros Van Life
Todas as suas aventuras estão, desde o início, registadas na página de Instagram dos Mochileiros, como são conhecidos. “Tínhamos as nossas páginas pessoais e muitas vezes acabávamos por partilhar a mesma fotografia em contas diferentes e então decidimos fazer a conta em conjunto. Cedo começamos a perceber o interesse dos amigos, amigos dos amigos, toda a gente queria saber mais sobre as nossas histórias, as nossas viagens, o que íamos vendo, e a página foi crescendo de uma forma orgânica e natural”, conta Pedro Cerqueira. O melhor de tudo? A comunidade que construíram que “dá dicas e ajuda a desfrutar melhor dos locais. Não há ninguém melhor do que as gentes locais para dar dicas, normalmente são óptimas e aproveitamos quase todas, nunca nos desiludimos”, diz, emocionado com o feedback que chega das “pessoas que se sentem inspiradas” por eles. “Quando nos dizem que o dia delas fica melhor se virem as nossas aventuras, é gratificante, até nos deixa sem jeito, porque não temos palavra, é muito bom sentir esse carinho”, afirma.
Um carinho que cresceu e se estendeu ao mais recente membro da família. Lourenço tem sete meses mas já viaja com os pais desde os dois. “O primeiro mês ficamos mais por casa mas a partir do segundo já começamos a sair. Com dois meses, ele foi à Madeira e portou-se muito bem. Já se habituou às viagens”, garante Carolina Vieira. Sobre viajar na estrada com um bebé, dá alguns truques. “Tentamos fazer o percurso entre os sítios na hora da sesta dele. A verdade é que dorme muito melhor na Pingu do que em casa porque em viagem cansa-se mais, tem imensos estímulos, está alerta durante o dia e quando chega à carrinha adormece. Surpreendeu-nos bastante a adaptação dele à Van Life, é um bebé muito bem-disposto, simpático, tranquilo”, descreve. O objectivo de que ele seja “uma criança sociável, que se dá com toda a gente” está a ser atingido. “Estamos constantemente com amigos e ele não estranha ninguém e tem a ver com, desde muito pequenino, o levarmos para todo o lado e estar sempre em contacto com pessoas. Nasceu em 2020 mas não é um bebé de pandemia, não é um bichinho-do-mato que não está habituado a ver pessoas”, afirma.
O ano passado, com os confinamentos, foi “complicado”, a Pingu teve de ficar fechada na garagem durante alguns meses, mas assim que “as portas da prisão” abriram, os Mochileiros partiram à aventura pela EN2. “Estávamos em casa mas estávamos sempre a idealizar a próxima viagem. Custou-nos imenso estar parados mas deu tempo para investir em outros projectos, como a conversão de carrinhas e… o Lourenço”, brincam Carolina Vieira e Pedro Cerqueira, que têm uma rotina fixa de semana de trabalho de segunda a quinta-feira e viagem na Pingu entre sexta e domingo. “Estamos sempre fora de casa e a pensar no que vamos fazer ao fim-de-semana”, diz Carolina Vieira. E com tantos destinos percorridos, que viagens faltam? “Ainda falta muita coisa, temos de pensar em sítios acessíveis com a Pingu, não vamos ao Japão, obviamente. Já fizemos grande parte dos países que queríamos na Europa, mas adorávamos fazer a parte Norte – Noruega, Dinamarca – e acho que será uma das próximas viagens”, afirma.